quinta-feira, fevereiro 21, 2008

Ritual


Tomou banho (com todos os requintes de exfoliantes, perfumes e cheiros)

Saiu, colocou o creme hidratante nas pernas para elas não ficarem secas.

Colocou o primeiro hidratante no rosto (aquele para combater a dermatite)

Foi à sala e ligou a aparelhagem. Aerosmith, como sempre, naquelas ocasiões.

Voltou à casa de banho e colocou o segundo hidratante no rosto.


Tratou de outros detalhes de higiene que não interessa agora pormenorizar.
Penteou o cabelo molhado.

Foi para o quarto e vestiu as cuecas pele de leopardo fio dental (aquelas que uma vez tinham caído para o estendal da vizinha de baixo; que ela tinha tido que ir lá pedir; e que lhe tinham sido entregues com um olhar de incompreensão, repugnância e curiosidade, mas sem palavras)

Depois o sutiã que dava com aquela roupa.

Da sala, vinha um "I was crying when I met you, now I'm trying to forget you, your love is sweet misery"... em volume consideravelmente alto. Apenas abaixo daquele que levaria os vizinhos à sua porta.

Olhou para o armário, ainda com dúvidas. Depois foi ver o roupeiro.

Saíram as calças pretas que vestiu, depois das meias.

Dançou pelo corredor e foi procurar a blusa. A regra é nunca usar aquilo que seria o máximo dos máximos: da elegância, do sex-appeal, do enfeite, da decoração. O menor excesso vai ter imediatamente o efeito árvore de natal, por isso é preciso ter cuidado.

Uma blusa simples. Um decote? Talvez, mas não necessariamente. Não é por aí...

Preto, sempre preto... Não. Hoje vamos de vermelho. Manga curta de cetim vermelho. Efeito red devil.

Não se calçam os sapatos ainda, queremos continuar a receber bons dias e boas tardes dos vizinhos de baixo... ah, e que nos devolvam as cuecas quando elas caem para lá.

Pegou no secador e foi secar o cabelo em frente ao espelho.

"The punishment sometimes don't seem to fit the crime" - Steve Tyler cantava, quando o secador se calou.

Cabelo penteado, colocou a fita para o afastar da cara. Colocou um bocadinho de corrector nos pontos difíceis. Depois, a base em creme. Nos olhos, uma sombra branca em cima, cinzenta ao meio, e depois, um risco preto feito milimetricamente, com o eye-liner.

Retocou o rosto com a base em pó. Pintou os lábios com contorno, batom e gloss, a tríade imbatível. Colocou um pouco de blush, mas pouco (como é que ela tinha tanta coisa??).

Voltou para o corredor, e apreciou-se no outro espelho, com outra luz.

A seguir, pensou na bijuteria. Pouca coisa, olha a árvore!

Umas argolas de prata. Pronto, that's it.

Voltou para o corredor, olhou-se ao espelho novamente (nunca é demais) e foi à sala fazer um skip, pois a música do momento não era das suas preferidas.

Quarto. Perfume. Donna Karan, Black Cashmere, a edição que já saiu do mercado e que ela correu a cidade para encontrar o último frasco.

Foi ao roupeiro e tirou o casaco.

Depois, finalmente, foi calçar os sapatos.

Foi à sala e, com pena, desligou a música.


"Saíu para a Rua", como cantava o Rui Veloso, mas não insegura. Pronta para o mundo inteiro.

Ia chegar atrasada, mas que importa? A festa tinha começado duas horas antes, ali mesmo em sua casa.

4 comentários:

Jo disse...

Nem mais, minha amiga.
E eu, que já partilhei esse ritual contigo, sorrio ao ver-te nesse estado de espírito.
A festa de estar bem consigo mesmo.

beijos mil

Abssinto disse...

E fez um brilharete! Gostei do pensar dela para a sua "etiqueta".

bj

Heduardo Kiesse disse...

"um cantinho para divagar... devagar"

nota 20!!
:-)
beijão!

Anônimo disse...

Bem vindo, paradoxo, a esta pequena comunidade!

;-)

Marta