Para muitas pessoas, cumprir um horário é o sinal da honestidade laboral: entra-se às nove, sai-se às cinco (de preferência com pontualidade) e eis que o patrão nada mais pode reclamar porque, que mais não seja, o empregado, ESTEVE LÁ. Para muitos isto basta, até, por vezes, para os próprios patrões, eles próprios sem conseguirem aferir muito bem o que é que o empregado produziu naquele dia.
O meu contrato é dos célebres e malfadados recibos verdes. Isto significa que, legalmente, eu não deveria ter um horário, pois sou paga à tarefa. Acontece que o meu contrato me obriga a cumprir cerca de 40 horas semanais, e com um horário estipulado e fixo à partida. Isto é aquilo que se chama o "falso recibo verde" - a pessoa que, na prática, trabalha como um funcionário, mas que, como não o podem colocar no quadro, é um prestador de serviços com uma lógica subvertida.
Ora, a maior parte d0s falsos recibos verdes, que são, por sua vez, a maioria dos recibos verdes, aguenta a chatisse de ser falso para um dia vir a "entrar"; ou seja, aceita abdicar das características verdadeiras do seu contrato de trabalho, para, forçado, adoptar as outras (que correspondem a regalias que ele não tem, como férias e subsídios de natal), na esperança de que assim, possa vencê-los (aos patrões) pelo cansaço; que ao fim de 14 anos percebam como ele faz ali falta e forgem um concurso para o dito entrar. Entretanto, vão-se apanhando todos os vícios do funcionário público...
Ora eu, talvez por ter trabalhado vários anos como um recibo verde verdadeiro, não me habituo agora a esta coisa. Odeio que me façam cumprir um horário. Produzo muito mais ao ver o tempo a passar e o trabalho a chamar-me do que nisto, de entrar às nove e sair às seis. Porque há dias em que não apetece; porque há dias em que não se consegue encontrar concentração. Porque de vez em quando me apetece trabalhar entre as oito horas da noite e a meia-noite. E ainda não conseguiram subverter-me a pensar que basta estar aqui, porque depois o resultado é este, estou aqui mas não estou.
Esta independência prejudica muito a minha "entrada" para onde quer que seja. Porque o que anima a minha vida é a eterna esperança acerca das possibilidades aliciantes que me esperam; de tudo o que ainda posso vir a fazer. É como uma adrenalina qualquer. E "entrar" será como me dizerem: "olha, agora não sonhas mais! Estás aqui e cumpres o horário." E depois? se tens uma colega chata, tens que a aturar ad eternum... se trabalhas bem e o chefe gosta de ti, tens a animosidade de todos os colegas...é um problema sem fim.
Assusta-me o definitivo. Odeio cumprir horários.
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