sábado, setembro 08, 2007

As linhas da vida

Hoje, num restaurante onde almoçava, havia uma televisão à minha frente. Apesar de a companhia ser muito agradável e de a conversa nunca esmorecer, de vez enquando os olhos escorregavam até ao écran. A televisão mostrava um evento social - acho que era uma corrida de cavalos com os "sheiks" da Arábia e muito luxo. A apresentadora entrevistava algumas das socialites presentes. Sem possibilidades (nem vontade, aliás) de ouvir o que diziam, a minha atenção concentrou-se nos seus rostos.



Não gostei do que vi. As entrevistadas estavam glamorosamente vestidas; os cabelos arranjados; a maquilhagem cuidada; de longe, um aspecto deslumbrante. Porém, o cruel cameraman focou os seus rostos bem de perto:Alguns lábios estavam anormalmente grossos; depois, as maçãs do rosto estavam impecáveis - esticadas, altas, e sem nada que as desabonasse. Mas, debaixo delas, surgiam traços deselegantes, que o rosto da minha mãe não tem, nem têm muitos outros rostos que conheço.



Estes não são os traços do envelhecimento propriamente ditos, mas os que ficaram após terem sido retiradas as temidas rugas. Aquelas mulheres (eram três) não eram jovens e isso via-se perfeitamente, apesar de todos os cirúrgicos esforços para que isso não acontecesse. Os seus rostos ficaram estranhos, distorcidos, como uma máscara onde se alterna a expressão e a inexpressão. Ficaram muito feias, apesar de sorridentes.


Mas, mais do que a tristeza de observar estas mulheres alteradas, fica a pena de perceber todos os esforços que fizeram para não parecer que envelheceram. Isto fez-me lembrar uma conversa havida com o meu bom amigo Paulo (aquele que eu tratei tão mal no post do outro blog) sobre as actrizes brasileiras: na altura falámos sobre o aspecto radiante e jovem da Sónia Braga e da outra que agora não me lembro o nome (lá as plásticas são mais bem feitas e a Globo usa filtros nas imagens para disfarçar as rugas que escaparam à cirurgia). Yoná Magalhães e Glória Menezes também estão bem longe de aparentar os 70-80 anos que devem ter. Eu disse ao Paulo que maravilhosa era a tecnologia. E ele respondeu-me, com uma razão que na altura não lhe dei, que era quase sinistro, pois com isso, a televisão, que influencia a sociedade e os comportamentos, não deixa as mulheres envelhecerem em paz.


Sim, as mulheres acham que não se podem dar ao luxo de envelhecer. Têm que estar enxutas, têm que estar magras, não podem decair. São rosas que não podem florir nem murchar, têm que cair e perecer ainda com o aspecto de botão.


Será que pensamos que os homens já não gostarão de nós se aparentarmos a idade que verdadeiramente temos? Antigamente, a mulher casava, cortava os longos cabelos, tinha filhos, engordava, mas isso não tinha qualquer importância porque nunca mais na sua vida precisava de se pôr bonita para nenhum homem. Aquele já lá cantava e, mesmo que uns anos mais tarde ele procurasse noutra freguesia o sexo que ela (eventualmente) já não tinha paciência para lhe dar, isso não acarretaria um divórcio porque o homem não tomaria, por si próprio, a iniciativa de se divorciar - portanto, só se a mulher quisesse muito é que voltaria ao estado single. Mas as mulheres perdoavam muitas vezes as traições para manter o establishment, acarinhado por todos.


Hoje em dia é outra conversa: qualquer um/uma, pode voltar ao estado original a qualquer momento, por isso mais vale não descuidar. Mesmo assim, pode parecer a uma mulher madura que nunca conseguirá competir com uma menina de 20 se não jogar com os mesmos trunfos que ela - a aparência. É no entanto um engano. Se a regra do jogo for a da aparência, a corrida está perdida à partida.


Mas, se acreditarmos que os homens que interessam poderão preferir uma mulher com linhas vincadas mas com o mesmo background que eles em vez de uma cabecinha mais oca que usa um vocabulário que eles nem sequer dominam, então talvez nos deixemos envelhecer em paz, sendo verdadeiramente apreciadas por aquilo que somos, com toda a nossa história de vida, sentido de humor, cultura e a beleza de uma rosa que abre as suas pétalas e solta o seu perfume.

3 comentários:

Jo disse...

Oh minha amiga... preocupar-se com o envelhecimento é que faz rugas! Claro que há sempre que cuidar, e tu bem sabes, olha aí a ajudinha da MK...:P
Mas sem stress e sem artifícios.

Beijos

Anônimo disse...

É cada vez menos para agradar aos homens mas para se agradarem a si mesmas. Estou certo de que se as cirurgias plásticas fossem mais acessiveis, o mulherio com mais de 50 anos andava todo num virote. Nem te passa a quantidade de Caminhantes (esse novo desporto urbano) que passam À porta da minha casa, e sao quase todas mulheres entradotes. Penso que tanto as mulheres como os homens começaram a querer manter-se jovens, até pq muitas dessas pessoas nao se sentem velhas. E fazem de tudo...Às vezes com resultados pessimos como os os inexpressivos rostos de que falas. Os solários tambem dao cabo da pele das tias o que e bem feito:P

bj
abssinto

Anônimo disse...

Eu acho que é bom que as pessoas não se sintam velhas e que caminhem e se mantenham saudáveis. Só que os anos são inevitáveis, e o que é ridiculo não é ter 60 e querer estar bem, é ter 60 e querer parecer 20.

Beijos aos leitores queridos