Ao ver-te Veneza, no fundo das minhas fotos, invade-me uma imensa nostalgia. Como um amor novo que, depois de encontrado, pensamos como pudemos estar toda uma vida sem o conhecermos. E à alegria da paixão sucede-se rapidamente o abandono do ser amado. Dor.
Paixão líquida, como um veneno que suavemente se insidia e, ao darmos por conta, já nos invade e contamina as entranhas. As ruas que, passo a passo, aprendi a conhecer, que se tornaram mais familiares e menos notadas, faltam-me agora. As ruelas esguias e as casas por reformar que não fotografei vão esta noite ensombrar os meus sonhos.
Perniciosa Veneza. Guardaste os pombos para os incautos turistas da Piazza S. Marcos e a mim deste-me visões bem mais belas, que agora me atormentam.
Dormi aninhada no teu silêncio e caminhei no teu sol. Respirei o teu sal e com os olhos beijei mil vezes o teu mar. E agora abandonas-me e deixas as minhas memórias à sorte da reportagem fotográfica que não quis fazer e dos postais ilustrados que parecem um pouco artificiais.
A Lua venera-te, querida Veneza, mas até nisso me levaste à certa. Depois de um enamoramento fugaz, julguei que ela me acompanharia, mas ela deixou o canal vestido de negro e a minha alma um pouco mais densa. Quem sabe, não me julgou suficientemente enamorada.
Estou agora à tua mercê, como os amores irreversíveis, aqueles em que, quando damos por conta, já é demasiado tarde, já nada há a fazer e estamos frágeis, inseguros e completamente dependentes.
E no fundo do fundo das memórias estão uns olhos que riem para mim e que me fazem escrever coisas tolas. Tais são os riscos do enamoramento.
(escrito em Junho passado, após uma viagem a Veneza)
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